Olá!
Nesse número, trazemos uma reflexão sobre as eleições na Venezuela de um ponto de vista anarquista. Que questionamentos o regime de Nicolás Maduro gera sobre o comunismo nos dias de hoje?
Estamos chegando no último quarto do ano, período marcado por uma concentração de feiras anarquistas pelo Brasil. Seguindo o modelo da Feira de Belo Horizonte, que rolou em julho, as feiras são eventos propícios para uma aproximação ao trabalho dos coletivos, que expõem materiais e apresentam projetos políticos. Também nesse número apresentamos o que vai acontecer em Recife, em Porto Alegre, no Rio de Janeiro e em São Paulo nas próximas semanas.
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Bom proveito!
A Venezuela e a esquerda brasileira
Após o povo venezuelano ter ido às urnas há mais de um mês, o exílio do candidato Edmundo González na Espanha parece ter encerrado o cenário para qualquer reviravolta nas eleições. Nicolás Maduro seguirá como presidente com um novo mandato começando em janeiro. Pouco importa o prazo estipulado pelo mandato, afinal Maduro está hoje numa posição na qual ele pode fazer o quiser. O último processo eleitoral provou a sua onipotência ditatorial na Venezuela.
O regime autoritário, formado há vários anos, ganhou novos contornos a partir da condução do processo eleitoral. Já se sabia que Maduro teria grandes dificuldades de passar pelo crivo das urnas, a despeito dos esforços empreendidos nos últimos anos. Entre esses esforços, estiveram os movimentos de aproximação das igrejas evangélicas, sendo a Igreja Universal do Reino de Deus a aliança mais destacada. Ele deu um grande apoio (principalmente financeiro) às igrejas em troca de associarem sua imagem a seus preceitos religiosos. Um exemplo intrigante é o Super Bigote, personagem de desenho animado que representa Nicolás Maduro como um super-herói no estilo Superman. No último episódio, quando o herói enfrenta um diabólico Elon Musk, ele utiliza uma Bíblia e um crucifixo e se coloca como Davi enfrentando Golias.
Além de buscar os evangélicos, Maduro também demonstrou boa vontade com o empresariado nacional e os militares. Uma de suas ações para agradar os empresários foi a flexibilização da política salarial, que permite pagar funcionários com um salário em bolívares próximo ao mínimo oficial, complementado com um bônus pago em dólares. Esse abono não incide em cálculo de férias, benefícios, participação de lucros e outras garantias trabalhistas, prejudicando os empregados e aliviando o bolso dos empresários. Quanto aos militares, o ditador seguiu a política estabelecida desde os tempos de Chávez de ter as Forças Armadas como principal base de governo. Atualmente, a Venezuela tem mais de 1.300 generais, que controlam empresas estatais como as dos setores de petróleo e de mineração e ocupam postos-chave na burocracia.
Externamente, o regime de Maduro se sustenta na retórica anti-imperialista. As ingerências dos EUA nos assuntos internos da Venezuela, com apoio à oposição neoliberal e neofascista, são inegáveis. Contudo, a oposição também é formada por grupos que propõem uma alternativa à esquerda, apesar da repressão que sofrem. É conveniente ao presidente e aos neoliberais abafar esse setor, formando, assim, uma dicotomia que se retroalimenta: de um lado, o regime ditatorial precisa de um Leopoldo López e de uma Maria Corina Machado para justificar seu papel de defesa contra o fascismo e o domínio dos EUA; do outro, quanto mais o regime ganha contornos ditatoriais, mais hegemônica se torna a extrema-direita na oposição frente ao fechamento do regime. Define-se, assim, um circuito antipopular no compasso da dinâmica geopolítica, como bem identifica Raúl Zibechi:
A verdade é que a geopolítica esmaga os povos e os movimentos, condenando-os a uma prisão conceitual e política. Como a lógica dos blocos está se impondo (Norte Global e Sul Global, por exemplo), aqueles que não se somam a um dos lados desaparecem dos grandes meios de comunicação.
Diante de tal dinâmica, é necessário prestar atenção na leitura que o campo da esquerda brasileira faz da conjuntura. O setor reformista, capitaneado pelo PT, segue apoiando cegamente Maduro e seu regime. Em conjunto com a nota do partido, militantes do MST e do Levante Popular da Juventude chegaram a viajar para apoiar in loco a fraude eleitoral. Gilberto Maringoni falou abertamente: “Na Venezuela, defender soberania implica passar por cima de resultados eleitorais objetivos”. Parte da esquerda, assustada com a franqueza e preocupada em ainda manter certos pudores, prefere repetir o credo da lisura das eleições, como afirma Valter Pomar na resposta a Maringoni: “na minha opinião, a ‘tarefa inicial’ é outra: reconhecer que ‘tudo indica’ que Maduro ganhou as eleições e defender o respeito ao resultado”. Nada diferente ocorreu na esquerda revolucionária, que em nenhum momento se opôs de maneira direta e clara à ditadura de Maduro.
A Venezuela obriga os comunistas a expor o que pensam e desejam no cenário social que se forma no nosso presente e futuro. A defesa de Maduro mostra com clareza a desconexão com os problemas populares e a matiz autoritária. Em entrevista para um jornal português, Óscar Figuera, secretário-geral do Partido Comunista Venezuelano, que faz parte da oposição à ditadura madurista, lança a questão: “Acham que conhecem a Venezuela melhor que nós?” Pelo jeito, há muitos no Brasil que acreditam que sim.
Militante é morto em protesto no Chile
No dia 8 deste mês, no Cemitério Geral de Santiago, no Chile, o companheiro Alonso Verdejo (26 anos) foi assassinado em meio à repressão de um ato em memória dos 51 anos do golpe de Estado de Augusto Pinochet. Os manifestantes foram acossados e feridos não só pela polícia, mas também por civis que se diziam “contramarcha”, em apoio à violenta ação estatal. Dentre eles, estava Patricio Salerick Villafaña Juica, responsável por esfaquear três pessoas, inclusive Verdejo, que acabou por falecer no hospital. Expressamos nossa solidariedade às vítimas e nosso apoio à sua luta.
Confiram mais detalhes e registros em vídeo do ocorrido no nosso blog.
Minicurso “Mikhail Bakunin e AIT”
No final do mês, organizaremos (ao lado do GPEL) um minicurso sobre as ideias de Mikhail Bakunin e a experiência da Associação Internacional dos Trabalhadores.
Bakunin e a AIT foram fundamentais para o surgimento do movimento anarquista tanto no que diz respeito à forma de organização federalista, descentralizada e horizontal, quanto em suas proposições acerca da educação e da ação direta. Portanto, nosso objetivo é comemorar os 210 de Bakunin e 160 anos da AIT, abordando seus fundamentos teóricos e práticos, bem como de que maneira suas reflexões e lutas sociais reverberam atualmente.
O mini-curso vai acontecer em três dias, sempre no período noturno (19h-22h):
30/09 - Aula 1: “O desejo de destruir também é um impulso criativo: Associação Internacional dos Trabalhadores e Mikhail Bakunin”, ministrada pelo professor Alexandre Ribeiro Samis.
01/10 - Aula 2: “Reconciliando a ciência e a vida: o projeto de educação de Bakunin na AIT”, com o professor Rodrigo Rosa da Silva.
02/10 - Aula 3: “Um mundo que caibam muitos mundos: reverberações das lutas libertárias na construção de outras realidades”, realizada pelos professores João Francisco Migliari Branco e Lúcia Emília Nuevo Barreto Bruno.
O mini-curso é aberto à participação de todas as pessoas interessadas. Caso queria certificado, o interessado deve se inscrever aqui. Você pode encontrar mais informações no nosso site.
Vem aí a temporada de feiras anarquistas: programe-se!
A partir dessa semana, teremos uma sequência de feiras em vários cantos do Brasil. Quem puxa a fila é a Feira Anarquista de Recife, que terá sua segunda edição no próximo dia 15. Acompanhe as atividades no post abaixo:
Na semana seguinte, será a vez do II Festival de Cine Anarquista de Porto Alegre. Siga a página a seguir para acompanhar o cronograma e a programação dos três dias.
No próximo mês, teremos a 3ª Feira Anarquista do Rio de Janeiro. Está distante, mas já guarde na agenda: ela vai acontecer no dia 19 de outubro! Acompanhe a página para saber mais da feira, inscrever suas atividades ou enviar um cartaz.
Você também pode enviar seu cartaz para a Feira Anarquista de São Paulo! Veja como participar no post abaixo:
Agenda de atividades
13/09, às 19h - O Capitalismo é um Horror: exibição do filme “Eles vivem" (They Live, 1988) com pipoca, seguida de bate-papo. Onde: Esp(a)ço - Rua Castro Alves, 101, Porto Alegre.
15/09 - Prazo final da pré-venda dos livros Tão negro quanto a resistência - Buscando as condições para a libertação, de Zoé Samudzi e William C. Anderson, e A nação fora do mapa - Anarquismo negro e abolição, de Anderson. Onde: venda pela página Escurecendo o Anarquismo.
15/09, a partir das 15h - II Feira Anarquista de Recife. Onde: Rua da Aurora, Recife.
20, 21 e 22/09 - II Festival de Cine Anarquista de Porto Alegre. Onde: Ocupa Rexistência POA - Rua dos Andradas, 1780, Porto Alegre.
28/09, às 18h30 - CinEspaço: exibição do filme “Como explodir um oleoduto" (How To Blow Up a Pipeline, 2023) com pipoca, seguida de bate-papo. Onde: Esp(a)ço - Rua Castro Alves, 101, Porto Alegre.
19/10, das 11h às 20h - III Feira Anarquista do Rio de Janeiro. Onde: SINTTEL - Rua Morais e Silva, 94, Rio de Janeiro.